O ticket médio é um indicador fundamental para os negócios digitais, uma vez que oferece um panorama da saúde do negócio. Por exemplo, é possível combiná-lo com percentuais de crescimento para obter projeção de faturamento, bem como obter perspectivas de ponto de equilíbrio (breakeven) de um produto. Outro exemplo é quando confrontamos com o Custo de Aquisição de Clientes (CAC), entendemos o tempo necessário para obtermos o Retorno sobre o Investimento (ROI).
Quando relacionamos ticket médio e análises temporais é possível entender o cenário da qualidade do nosso produto na visão dos usuários e pagantes, ou seja, quanto mais nossos usuários estão pagando e por mais tempo, quer dizer que estamos entregando o valor esperado por eles ou muito próximo disso.
Por esta razão, tangibilizar a proposta de valor do seu produto é uma etapa desafiadora, mas que irá nortear o sucesso ou não do produto. Não é óbvia, nem simples e muito menos uma receita de bolo. Colocar em prática exige que o PM conheça inúmeras variáveis, tais como mercado, concorrentes, modelos de negócios factíveis, público-alvo e dores, embasando assim o direcionamento estratégico do produto.
Mapear estas e outras variáveis irão permitir que o PM identifique e explore as alavancas que serão chave para o crescimento e entrega de valor. Algo que está diretamente ligado à dicotomia: buscar entregar valor do produto por meio de novos desenvolvimentos ou aplicar novas estratégias sobre produtos já existentes.
A disfunção do "novo" como estratégia de valor
É bem comum que as empresas convivam com a disfunção de que é preciso sempre estar lançando novas funcionalidades ou novos produtos e até mesmo novos negócios para atingir o objetivo de crescimento e de maior lucratividade.
Essa forma de pensar faz com que elas vivam um eterno ciclo de lançamentos, buscando entregas de valor, o que não garante impacto no ticket médio, por exemplo. E foi esse incômodo que me desafiou a olhar por um ângulo diferente e fazer a seguinte pergunta: ''Sempre precisamos de novos lançamentos para alavancar o crescimento do nosso negócio ou podemos usar algo já existente como alavanca em estratégias diferentes e em momentos diferentes dentro do ciclo de vida do produto?"
Seu ticket médio não exige um novo lançamento
Fazendo uma correlação com o artigo "Alavancas de plataforma, o que são?” onde falamos sobre como as alavancas de crescimento podem estimular crescimento de plataformas ou até mesmo ser atores de fricção, a principal conexão que proponho é entender como estas alavancas podem ser exploradas de formas diferentes para atingir objetivos diferentes, sem exigir que sua empresa fique presa nesse eterno ciclo de novos lançamentos.
Assim como Diego Eis aborda no artigo "Novos negócios não são garantia de entrega de valor e entendendo um pouco mais sobre Outcomes", focar em entregar novas features, produtos ou até mesmo um novo modelo de negócio, não garante resultado do produto e negócio. Se você quer que seu usuário torne-se pagante ou aumente o valor pago pelo uso do seu produto, comece entendendo o porquê e como seu produto é utilizado por ele, assim, ficará claro para você quais necessidades você atende e quais oportunidades existem para impactar positivamente o comportamento do usuário e entregar valor, gerando resultado para o negócio.
Por exemplo, o iFood adota a funcionalidade do cupom em duas estratégias adjacentes. Primeiramente, concedendo cupons para remover barreiras de entrada e conquistar a ativação de novos usuários. Estes cupons têm o objetivo de facilitar a primeira entrega de valor, que deve servir como estímulo na criação de um hábito, pois quando um usuário já extraiu o valor do produto alguma vez, torna-se mais fácil e menos custoso continuar entregando valor.
A segunda estratégia aplicada sobre esta funcionalidade é a disponibilização dos cupons no clube iFood, onde usuários podem comprar pacotes de cupons. Nesse outro modelo, o iFood impacta indicadores do negócio em dois momentos. O primeiro quando cria uma nova fonte de receita, aplicando o cross sell nesses usuários, e o segundo ao estimular a recorrência de pedidos no aplicativo através dos cupons e do gatilho da validade deles.
Neste segundo momento, a feature é o meio para aumentar a recorrência deste usuário, gerando valor para a plataforma. Essa recorrência representa mais demanda (qualificada) para os restaurantes da plataforma, entregando valor para o usuário com maior frequência, por meio de uma experiência digital. Vale lembrar que parte destes novos pedidos representam mais demandas para os entregadores, atraindo cada vez mais esses atores. Fortalecendo o efeito de rede da plataforma.
Isto significa fomentar demanda para todos atores da plataforma, impactando métricas de produtos como CAC, recorrência e engajamento, o que alimenta indicadores de negócio, tais como o ticket médio.
Conclusão
Crescer a base de usuários é um indicador que diz muito sobre seu produto, por exemplo, poder de adoção e capilaridade. Mas não significa que sua base tenha crescido com bons números de engajamento. Aplicar estratégias de retenção e engajamento são cruciais para o sucesso do seu ticket médio.
O alto engajamento dos usuários garante que você está entregando o valor esperado, que este valor está sendo percebido e extraído na sua completude. Sendo assim, cada vez que esse ciclo se completa, você garante maior engajamento pelo sucesso do seu usuário. Além de promover sua proposta de valor, impactar o comportamento dos usuários, criar hábitos e, assim, impactar positivamente o negócio. Ou seja, o usuário engajado vai ser mais recorrente nos seus pagamentos e/ou pagar mais pelo seu produto, isto significa aumento do ticket médio.
O caso do iFood é um exemplo de como materializar estratégias adjacentes focadas em fases do ciclo do produto e da jornada do usuário, impulsionando a extração de valor e endossando o engajamento de usuários ativos. Por este motivo, é importante que você entenda o cenário atual, os próximos horizontes do seu produto e como estes momentos irão conectar-se com o seu ticket médio.
Referências
- Livro: Outcomes Over Outputs
- Artigo: Novos negócios não são garantia de entrega de valor e entendendo um pouco mais sobre Outcomes
- Artigo: Fricção: onde o simples fica complicado e o complicado, impossível
- Artigo: Gerenciando o produto por resultados (outcomes) e não por entregas (outputs)
- Artigo: Alavancas de plataforma, o que são?