Times fornecedores (ou terceiros) de produto: como lidar?

A contratação de uma software house ou até mesmo de PMs de empresas terceiras pode estremecer as relações entre contratante e contratado.

Times fornecedores (ou terceiros) de produto: como lidar?
Photo by Alex Rosario / Unsplash

Embora muitos livros e artigos sobre produtos digitais mencionem a importância de times empoderados, a realidade costuma ser um pouco diferente. Em busca de viabilizar a transformação digital ou até mesmo impulsionar a área de Tecnologia como um todo, muitas empresas optam pela contratação de software houses para montar seus primeiros times.

O roteiro de muitas empresas é semelhante: contratam uma empresa terceira, com o objetivo de contar com a expertise de tecnologia a fim de acelerar a transformação digital. De início, o percentual de profissionais de tecnologia terceirizados tende a ser alto. À medida que a empresa vai ganhando maturidade, lançando produtos e, enfim, trazendo melhores resultados com a tecnologia como meio, a tendência é diminuir a quantidade de profissionais terceirizados, muitas vezes absorvendo a contratação de alguns deles.

O modelo de outsourcing em tecnologia está presente em diversos times de produto. Inclusive, tem-se popularizado o modelo de squad as a service, em que empresas entendem a necessidade de negócio para conectar um time inteiro dedicado à resolução do problema.

Seja como for, é importante ressaltar que lidar com times terceiros apresenta alguns desafios.

Você não faz gestão direta dos times

Como Product Manager, você não faz gestão direta das pessoas do time. Quando se trata de atuar com terceiros, essa ênfase é ainda maior.

Isso porque essa relação costuma se dar da seguinte maneira: muitas software houses orientam os colaboradores que vão atuar no projeto a entregarem o que o cliente precisa. E o PM, muitas vezes, é o principal representante da empresa contratante - afinal, ele conduz as cerimônias do time e responde para a devida entrega do produto.

Nessa dinâmica, o time terceiro vê o PM como o principal ponto de contato com a empresa que o contratou, evitando conflitos diretos ou qualquer tipo de desconforto que possa colocar o contrato em risco.

Existem diversos aspectos negativos dessa relação, e a principal delas é a autonomia para que os profissionais terceiros proponham divergência nas discussões.

Imagine que você, como PM, esteja conduzindo um refinamento a partir de uma user story incompleta. O time terceirizado participa e ajuda a fazer as pontuações. Um dos desenvolvedores, porém, acredita que este não é o melhor caminho a ser seguido, mas, sabendo que existe pressão de stakeholders para trabalhar com esta atividade, o PM tenta pressionar para que a atividade seja desenvolvida conforme proposto inicialmente.

Diante dessa investida, tanto o desenvolvedor como o time terceiro como um todo podem ficar acuados e irão seguir com o desenvolvimento da mesma forma.

O resultado pode não ser dos melhores: o time pode demorar mais para entregar o desejado e, pior, não se sentirá confortável para propor debates.

Proponha um ambiente de colaboração mútua entre os times, estimulando o debate em prol do que pode ser feito de melhor e mais efetivo em benefício do produto. Se necessário, conte com o apoio do Tech Lead (que geralmente é o profissional de referência para os times terceiros) e do Agilista (que cumpre o papel de facilitador para melhor saúde do time em benefício da empresa).

Cuidado com feedbacks e 1:1s

Quando trabalhamos no dia a dia com desenvolvedores, Tech Leads e outros profissionais da nossa empresa, muitas vezes criamos uma cultura de feedbacks - seja ao enaltecer entregas, compartilhando dores em comum ou até mesmo na hora de enfrentar algum tipo de conflito entre os integrantes do time.

Ao lidar com terceiros, porém, feedback direto vindo da parte do gestor em um 1:1 pode ser caracterizado como relação de trabalho, que fere os preceitos da relação cliente-fornecedor.

Caso tenha dúvidas sobre como se relacionar com um time terceiro, converse com o seu gestor e com a área de compliance da sua empresa. A falta de clareza nessa relação faz com que muitos times tenham relações disfuncionais: uns acabam dificultando a colaboração no time, enquanto outros se põem como gestores diretos.

Importante frisar: na relação com terceiros geralmente existe um responsável pela conta, que acompanha o trabalho dos profissionais. O feedback aos terceiros deve ser levado na conversa com esse responsável, que vai filtrar e direcionar às pessoas desenvolvedoras (contratadas pela software house e que integram o time) da melhor forma.

Crie uma frequência para conversar com o responsável pelos terceiros, sendo transparente ao mencionar cada profissional. É importante ter o Tech Lead e o Agilista como aliados nessas trocas. Se necessário, façam um alinhamento antes de conversar com o responsável pela conta, para unificar a compreensão de como cada profissional contribui para o time.

E quando o PM é um terceiro?

Existem casos de empresas que contratam um time inteiro, ou até mesmo optam por ter um Product Owner ou Product Manager de uma empresa terceira.

Geralmente isso acontece quando a empresa não possui a expertise de times de produto e tecnologia.

Enquanto PM, como terceiro, é preciso alinhar muito bem com o seu contratante qual o seu objetivo. Se ficar muito bem alinhado que este profissional está lá para impulsionar o negócio do contratante, alguns combinados devem ser feitos previamente.

Por exemplo: como o produto que este PM terceiro atua vai impactar na métrica de negócio do contratante? Como fazer esse acompanhamento?

Autonomia tende a ser um fator complicado nesse contexto. Algumas empresas contratantes costumam acompanhar o trabalho de perto e definem previamente, sem a colaboração do PM, qual objetivo a ser atingido. Isso costuma ser bastante comum.

Porém, a situação inversa também pode acontecer: a empresa contratante, sem domínio de como times multidisciplinares funcionam, dá plena autonomia para que a empresa contratante defina o trabalho do PM.

Nesse tipo de situação, vale a pena lembrar o que Michael Porter, famoso professor de estratégia empresarial da Harvard Business Review, nos ensina:

“Os fornecedores que são fortes e dominantes podem impor condições desfavoráveis ​​às empresas, enquanto os fornecedores fracos e dependentes podem ser vulneráveis ​​à pressão das empresas” (via ChatGPT).

Traduzindo: empresas que optam por dar autonomia demais aos fornecedores (terceiros) podem sofrer com algum tipo de descompasso entre os objetivos do contratante e do contratado. Alguns PMs, trabalhando para a empresa, podem estar mais preocupados em garantir a extensão do contrato do que em gerar valor para a empresa contratante.

E os terceiros com baixa autonomia se tornam suscetíveis a top downs e alta quantidade de demandas, com pouco espaço para contra-argumentação e para a mútua colaboração.

Atingir o equilíbrio nessa relação pode ser um processo de médio a longo prazo. Para muitas companhias, a contratação de terceiros é o meio necessário para capacitação de times de tecnologia na própria empresa. Algumas delas até podem estender seus contratos por muitos anos com software houses por motivos variados, mas tenha em mente que muitas delas também podem absorver os profissionais para dentro do negócio ao longo da ‘relação’.

Durante esse processo, porém, é importante ter clareza sobre o papel e a contribuição esperada de cada um, para evitar frustrações ou até mesmo a fuga de profissionais da empresa contratante e da empresa terceirizada.

Referências