As utopias do mundo do produto

Qual foi a sua maior quebra de expectativa construindo produtos digitais? Você estava projetando o mundo ideal ou vivendo a realidade nua e crua?

As utopias do mundo do produto
Pintura Adão e Eva no Jardim do Éden - Jan Brueghel, 1615. Fonte: Touch of Class

Há algum tempo eu venho pensando sobre os muitos memes "expectativa versus realidade" que vejo nas redes sociais e percebo uma semelhança muito grande na vida de uma pessoa no mundo de produto. Me lembro de várias conversas informais, cafés online e 1:1s estruturados tanto com meus gestores ou com meus liderados sobre um ponto muito importante em qualquer relacionamento seja profissional ou pessoal que é a quebra da expectativa.

Em uma conversa que tive em um Happy Hour com um coordenador de time de Design, lembro de falar que, apesar de deixar muito claro para meus liderados o que era possível de ser feito, o que não era possível e aquilo que poderíamos defender juntos para uma alçada maior, ainda sim, a projeção que alguns criavam os decepcionavam - e isso me frustrava. 

A expectativa é algo realmente muito particular, cada um cria a sua dentro dos fatores e o ambiente que está inserido, mas o que é utopia para cada um? Quatro grandes temas vieram rapidamente à minha cabeça enquanto pensava sobre esse assunto do mundo ideal e quero compartilhar com vocês a minha visão sobre elas. 

Utopia 1: Discovery para tudo

Vou começar com a mais polêmica: realmente precisamos fazer Discovery para tudo que queremos lançar? Vamos pensar juntos: se olharmos de maneira mais ampla existem lançamentos de produto que são inovação, outros são funcionalidades extremamente importantes que entram para mitigar algum buraco porque o produto que estamos trabalhando e o concorrente lançou mais rápido e outros são pequenos testes para validar de maneira mais rápida um comportamento ou resultado. 

Pense na sua resposta rapidamente. A minha resposta é: não, não precisamos fazer Discovery para tudo (e aí chega a decepção de quem quer fazer bons produtos digitais). Nessa conversa com o coordenador de Design, comentei meu ponto de vista e refletimos juntos: ele compartilhou uma reflexão que ficou pulsando na minha cabeça "em nenhum curso, nenhum livro, nenhuma formação alguém fala que esses processos maiores não são práticos de serem aplicados no dia a dia" e isso me fez concluir que a expectativa de quem entra no mercado de produto, sedento para aplicar tudo que aprendeu em um workshop depois de investir talvez milhares de reais, é literalmente esse emoji 🫠.

Livros, cursos, livros, workshops e trocas com outros profissionais são extremamente importantes, mas tudo isso é complementar à sua rotina de trabalho e ela é a mais essencial, é ela que te dá bagagem. Explico: um curso te mostra exemplos práticos de tudo que deu certo e só nisso já existe um problema: e o que deu errado?

Eu fui convidada para compartilhar um case de produto que trabalhei no Product Stars em 2021, mostrei todo processo de construção, desde o Discovery até a etapa de documentação final, foram 33 slides e em apenas um deles apresentei as lições aprendidas.

A expectativa é algo realmente muito particular, cada um cria a sua dentro dos fatores e o ambiente que está inserido, mas o que é utopia para cada um?

Ali foi um recorte mais generalista de um trabalho de três meses com muitas idas e vindas, conversas com stakeholders, inúmeras interações com time de desenvolvimento para entender o que cabia no MVP até chegarmos no modelo final. Erramos muito mas aprendemos tanto quanto, principalmente que todo esse processo não era escalável.

O ano tem 12 meses, se fizéssemos Discovery para tudo teríamos lançado 4 grandes produtos no ano. Faz sentido para os clientes? Faz sentido para o negócio? Isso gera valor?

Tudo bem, mas o que é esperado então? Eu acredito muito em habilidades comportamentais e na capacidade de adaptação. As famosas "soft-skills" precisam andar lado a lado com suas habilidades técnicas, é essencial conseguir fazer uma avaliação do cenário no qual você está inserido e entender o que você quer e aquilo que você consegue aplicar, isso torna qualquer profissional mais maduro. Avalie sempre três vertentes para chegar a essa conclusão: o que o usuário precisa, o momento da empresa e a capacidade que a tecnologia tem hoje de entregar aquilo que será proposto.

O equilíbrio aqui é fundamental, existem funcionalidades que o mercado em si já validou (por exemplo: contas digitais que rendem 100% do CDI), precisamos investir nosso tempo em validar isso novamente? 

Utopia 2: A teoria dos livros