O que são vieses cognitivos?

Entenda como os nossos vieses contribuem para os nossos hábitos diários

O que são vieses cognitivos?
Photo by Adrien Converse / Unsplash

Viés é um erro sistemático na forma em que entendemos os dados e as informações observadas. Esses vieses nos fazem, inconscientemente, privilegiar algumas pessoas, ideias ou coisas em detrimento a outras, sem ter a plena consciência do prejuízo que isso pode causar. Eles são armadilhas mentais que caímos a todo tempo, mesmo sem perceber. Todos nós possuímos vieses, e justamente por isso, precisamos ter consciência sobre eles para que possamos evitá-los.

Vieses nem sempre são óbvios, pelo contrário, muitas vezes eles são incompatíveis até mesmo com nossos valores conscientes. É comum termos preconceitos, mesmo sabendo que não há justificativas concretas para isto. Por exemplo, imagine que você comeu alguns vegetais como brócolis e cenoura quando criança e não ficou satisfeito com o gosto do alimento e, ao ficar mais velho, você foi exposto a outros tipos de vegetais como aspargos e berinjela. É natural que a sua primeira impressão seja de repulsa com esses novos alimentos, antes mesmo de experimentá-los, já que seu cérebro os colocou na caixinha de “vegetais” e criou o viés de que esse tipo de comida não tem um bom sabor. Mesmo sabendo que o gosto desses alimentos é totalmente diferente, seu cérebro já fez essa associação.

Lado positivo dos vieses

É válido dizer que os vieses cognitivos têm também seu lado positivo. Eles nos ajudam a filtrar os excessos de informações que recebemos todos os dias e a agir rápido em algumas situações.

Muitas vezes, precisamos tomar decisões rapidamente e com poucos dados a disposição. Os vieses nos munem com alguns padrões semelhantes aos que já encontramos ou ouvimos falar previamente, para que a decisão possa ser feita. Quando temos informações limitadas sobre algo nosso cérebro tende a compor o que falta com palpites de pessoas próximas, e isso ajuda a termos mais confiança para decidir. Além disso, os vieses cognitivos nos ajudam também a ter foco nas coisas mais urgentes em detrimento as entregas mais distantes.

Lista dos vieses conhecidos:

Segue a lista dos vieses conhecidos pela humanidade. Abaixo da imagem deixo um link para abri-la, dar zoom e analisá-la com mais precisão.

https://ritholtz.com/2016/09/cognitive-bias-codex/

É impossível ser totalmente isento de vieses, eles fazem parte de nossas vidas. O que podemos fazer é ter consciência de que eles existem e aplicar algumas boas práticas para tentar mitigá-los.

Vou trazer alguns vieses mais comuns no nosso dia a dia de produtos e como podemos evitá-los.

Confirmação

O viés de confirmação é a tendência de procurar informações para confirmar a sua crença inicial. É comum dar ênfase às evidências que confirmam as suas expectativas e ignorar pontos contraditórios.

Francis Bacon, o pai do “método experimental”, menciona algo que resume bem esse tipo de viés: “O erro mais peculiar e perpétuo do conhecimento humano é ser movido e ficar mais excitado por afirmações do que por negações.”

De fato, é muito mais satisfatório e prazeroso ter feedbacks positivos e ser recompensado com uma dose de dopamina pelo nosso cérebro do que receber negações que podem nos colocar pra baixo de alguma forma.

Vamos imaginar que você colocou uma nova feature em produção com o objetivo de aumentar o engajamento na sua plataforma. Essa nova funcionalidade foi desenvolvida por um certo tempo, e custou bastante energia no processo de discovery. Após uma semana você analisa duas métricas: Tempo do usuário navegando no site e Taxa de rejeição na página. Digamos que o primeiro indicador evoluiu em 25% e o segundo reduziu a perda de usuários na sua plataforma em 40%. Você comemora o sucesso da feature e comemora com o time o grande resultado.

Porém, com o passar do tempo o time começou a verificar uma diminuição do número de vendas. A feature que você colocou no ar piorou drasticamente a métrica de conversão do cliente e consequentemente as vendas despencaram. Ou seja, a funcionalidade deixou o cliente perdido na sua plataforma e por isso ele passava mais tempo navegando na sua página para encontrar o que precisava fazer e clicava em links inúteis para ele no momento.

Nesse caso, seu viés de confirmação fez com que você olhasse para os indicadores positivos e negligenciasse os negativos para validar a solução implementada.

Para evitar que esse tipo de viés aconteça, defina as métricas antes da solução ir pro ar e analise todas elas com cuidado. É importante coletar outros pontos de vista para verificar se os indicadores previamente escolhidos estão coerentes com o objetivo da solução.

Seleção

O viés de seleção se refere a uma distorção na análise estatística devido a má escolha da amostra. Se os dados forem selecionados com esse tipo de viés, provavelmente as conclusões do estudo estarão erradas.

Imagine, mais uma vez, que você quer aumentar o engajamento dos clientes, e para isso precisa entender de forma mais profunda como eles navegam no seu produto. Para iniciar essa descoberta, você pega os usuários com maior engajamento e analisa o comportamento deles.

Se, durante a análise, você encontrar um padrão de comportamento desses usuários e tomar isso como verdade, provavelmente você falhará na hora de criar e implementar a solução, porque você não sabe se esse padrão de comportamento encontrado é exclusivo de usuários engajados ou de toda a sua base.

Não faz sentido, por exemplo, fazer uma pesquisa de intenção de votos entrevistando apenas pessoas de direita ou de esquerda. Ou analisar o comportamento dos cidadãos de um país selecionando apenas moradores de grandes cidades e com um determinado poder aquisitivo. Ou ainda pesquisar hábitos de saúde de uma população selecionando apenas pessoas com alta taxa de açúcar no sangue.

Para evitar esse tipo de viés, é necessário sempre pegar uma amostra aleatória de dados. Caso queira identificar um padrão num determinado tipo de persona, você deve pegar uma amostra aleatória do perfil de usuário que você quer analisar e uma amostra de controle aleatória que representa a sua base. A partir daí você analisa os dois tipos de comportamento, verifica as diferenças e baseado nessas evidências é possível concluir se existe algum padrão específico no público-alvo da pesquisa.

Autoridade

Esse viés faz com que valorizemos de forma demasiada as opiniões de autoridades e especialistas num determinado assunto. É comum aceitarmos essas ideias sem questionamento de como a autoridade chegou na conclusão.

Desde pequenos fomos ensinados a respeitar as autoridades e, na maioria das vezes, sem questionamentos. Nossos responsáveis não abriram uma planilha no Excel para nos provar que comer legumes seria uma boa decisão por todos os benefícios que esse tipo de alimento pode trazer. Apenas nos era dito para ingerir o alimento, mesmo contra a nossa vontade.

Nunca fomos estimulados a questionar as afirmações dos nossos professores na sala de aula da escola durante o ensino médio e fundamental. Eles eram incontestáveis quanto à teoria apresentada, apenas podíamos tirar dúvidas sobre a verdade esplanada.

De algum modo, esse respeito à autoridade é essencial para mantermos a ordem na nossa sociedade. Porém, o erro faz parte do ser humano e é comum os especialistas errarem. Por isso, precisamos questioná-los sobre como chegaram àquela conclusão e que dados embasam a teoria criada.

Talvez você já tenha escutado falar no HiPPO (Highest Paid Person Opinion) e os riscos empresariais desse tipo de atitude. O HiPPO é um acrônimo que sintetiza o poder da autoridade. A pessoa mais bem paga da sala decide que caminho o time deve seguir mesmo sem ter nenhum dado para provar que sua escolha seria a melhor. Nesse momento, o time aceita a opinião da autoridade porque existe um medo de questioná-lo e na cabeça dos liderados, o HiPPO deve estar correto até porque ele é a pessoa mais bem paga do ambiente e deve saber o que está falando.

Para evitar esse tipo de viés, tente focar na ideia apresentada e não na pessoa. Isole o argumento e esqueça a pessoa, não veja a roupa que ela está vestindo naquele momento, o cargo em que ela ocupa ou a remuneração mensal. É importante questionar como aquela ideia foi criada, que dados foram levantados, como a análise foi feita e como chegou à conclusão final.

Conclusão

É importante enfatizar que o objetivo de um discovery é encontrar dores do mercado, e construir soluções que façam sentido para endereçar esses problemas. Não adianta desenvolver produtos para massagear seu ego porque o mercado é impiedoso e o resultado não virá se o discovery não for bem feito. Para fazer boas pesquisas e validações precisamos evitar os vieses e o primeiro passo é admitindo que somos enviesados por natureza. Posteriormente, devemos conhecê-los para que possamos traçar ações práticas para mitigá-los.

Referências