Como detalhes organizacionais podem acelerar ou desacelerar iniciativas disruptivas.
Certa vez, Pedro foi encontrar seu líder em uma sessão de feedback e ouviu o seguinte: “A estratégia do produto que você elaborou está perfeita, porém está te faltando gestão de stakeholder para avançar com a iniciativa”. Pedro era expert em gestão de produtos, com muitas certificações e formações internacionais, e bastante data-driven em todas suas atividades.
Para surpresa de muitas pessoas na empresa, a proposta de Pedro realmente não foi para frente, apesar de haver dados que justificassem, uma explicação bastante coerente e passos muito estruturados. Aparentemente a empresa estava perdendo uma oportunidade que iria se arrepender futuramente.
Pedro e a empresa são ficcionais, mas certamente eu e você encontramos muitos Pedros por aí, não é mesmo? Por que isso acontece?
Hoje em dia, quase todas formações de produto, projetos ou estratégia abordam a importância da Gestão de Stakeholders e apesar de tanto conteúdo acadêmico, falham diversas vezes em tentar prover uma abordagem prática para o tema. Entre conversas com experts e amigos da profissão, geralmente encontro o sentimento de incompletude dos materiais em trazerem fatores que sejam mais realistas com as discussões dentro das empresas.
Neste artigo, procurei oferecer quatro principais ferramentas que podem acelerar ou desacelerar (caso ignoradas) iniciativas quando se está em posição de liderança, ou sendo uma liderança matricial, que requer maior influência sobre outras áreas e níveis da empresa. Espero que estas ferramentas a seguir possam funcionar para você como novos filtros, ampliando sua compreensão de situações invisíveis, e possam ajudá-lo a criar novas alternativas de prosperar com iniciativas de alto potencial.
- Conciliar metas organizacionais e sistema de bonificação
Criar e desenvolver um sistema de gestão é uma tarefa árdua e de olhar detalhes. Não é incomum, encontrar organizações que na intenção de extrair o melhor potencial das pessoas e de suas estruturas funcionais, busquem por metas que aumentem a eficiência operacional individual de cada área, sem refletir como elas se conectam.
Um exemplo disso acontece em organizações tradicionais que buscam inovar, e geralmente criam times de produtos/inovação separados da estrutura principal da empresa, para focar na descoberta e refinamento do produto, com processos mais ágeis. Entretanto, muitas vezes essa estrutura está conectada a uma área de vendas da estrutura principal para conseguir oferecer seus produtos em larga escala, assim como o marketing, finance, people, e por aí vai.
Naturalmente, essas áreas do core business ou HQ não tem metas conectadas com a estratégia da estrutura menor, o que joga fortemente contra qualquer iniciativa e velocidade de crescimento de algo novo. O que faria uma área de vendas oferecer um produto ainda não muito bem testado, e que não tem a mesma grande rentabilidade e facilidade de oferecer o produto do core business?
“Tão importante quanto construir produtos matadores e bem sucedidos, é entender como ele se conecta na ‘nave mãe’ e possa ser incorporado adequadamente”.
Pensar nisso é tão ou mais importante que ter uma ideia boa em mãos. Pode ser que o caminho seja integrar metas, ou analisar como o produto pode ajudar outras áreas, ou como evitar essas dependências, de toda maneira, pensar e planejar isso é fundamental.
Não basta ter uma boa ideia, a execução é essencial.
- Identifique e converse com os “consiglieres”
Se você já assistiu Godfather (O poderoso chefão), possivelmente já ouviu falar em Consigliere, e o vínculo dela com as máfias italianas. Popularizado nos anos 70, esse termo ficou muito apropriado aos conselheiros das máfias, que tinham um importante papel ao lado das lideranças oferecendo conselhos adicionais e segundas opiniões sobre temas importantes.
Nos tempos atuais e nas organizações, existe um mito de que os organogramas representam integralmente a estrutura funcional da empresa. O que é bastante impreciso. Na prática, você vai sempre encontrar pessoas, sejam elas especialistas ou líderes, que são fontes importantes de conselhos, dados, ou até mesmo formadores de opiniões dentro da organização e que carregam papel importante na cultura e forma de trabalhar, embora isso não esteja escrito no seu crachá.
Identificar elas geralmente não é um trabalho árduo dado que elas recorrentemente participam de pautas que não estão no básico do job description e recorrentemente são abordadas para darem suas opiniões. Conversar com elas previamente é uma ferramenta valiosa de aprender sobre como a organização pensa e interpreta, e também se antecipar a várias questões que futuramente podem vir. Criar conexões genuínas e de troca de valor podem ser muito positivas.
- Conecte-se com a sua audiência antes dos eventos principais
É muito comum a preocupação absoluta em ter um deck que possa responder todas as perguntas possíveis, de todos os níveis, e sobre diferentes fases da mesma iniciativa. Tanto tempo dedicado em responder perguntas da audiência que geralmente nem sabemos se elas são somente nossas.
Uma forma muito ágil de validar as hipóteses é conversar com as pessoas que você acredita terem a maior chance de contribuição com dicas valiosas, e as pessoas que geralmente tem maior capacidade de influência em uma tomada de decisão. Isso agiliza MUITO. Consultores experientes geralmente dizem que os cafés trazem informações mais valiosas que horas de reunião.
Um erro muito recorrente, é preparar um encontro com várias pessoas ao mesmo tempo e um conteúdo extenso, a ser visto por todos pela primeira vez. Geralmente é fatal. Dezenas de dúvidas, falta de entendimento dos dados, desconforto para decidir, tédio, ou um mix de tudo isso é bem frequente em pautas formatadas assim.
É bastante sábio antecipar essas dúvidas, materiais, dados, insights, e construir ao longo do tempo, antes de um encontro que requeira uma decisão maior. Isso permite um tempo valioso de refinamento, entender melhor a extensão de conteúdo que se precisa construir, e se realmente você está pronto para propor uma decisão ou iniciativa nova. Costumo fazer a analogia de que é similar a passar um projeto no congresso, existe muita discussão nos bastidores antes de ir para votação na plenária.
- Crie radares informais de informação
Em organizações maiores, geralmente estarão disponíveis reports, encontros recorrentes, analytics, dashboards entre outros, visando potencializar os times com uso da informação e dos dados. Iniciativas maiores têm agendas com pessoas bem definidas, períodos de encontro e canais de comunicação bem acordados - ainda assim, sempre faltará informação.
O que acontece no dia a dia dos times ou na alta liderança, nem sempre tem a mesma velocidade de percorrer a organização e informar todas pessoas necessárias.
Às vezes isso decorre por falta da sensibilidade que aquela informação é valiosa em outros níveis, outras vezes pela incerteza de que ela é verdadeira, ou eventualmente pela sensibilidade que ela pode conter e ainda não ter sido tratada.
Conectar-se com pessoas que não estão necessariamente no seu contexto de atuação é fundamental para aprender mais sobre a empresa, os desafios, as oportunidades, e antecipar várias situações que podem ocorrer ao longo do caminho. Também é bastante valioso compartilhar informações com essas mesmas pessoas, para ouvir sobre o que elas pensam, eventualmente também contribuirá com elas em atividades que você não tinha visibilidade prévia. Pessoas que têm hábito de criar conexões, geralmente encontram projetos duplicados pela empresa quando passam por esse roteiro.
Muitas informações acabam ganhando forma na empresa com o tempo, e ter seus próprios radares, com conexões genuínas, conexões de confiança, é muito importante para que você possa refinar suas iniciativas ao melhor benefício para empresa, ou até mesmo caso não seja mais relevante continuar, você possa perceber o mais rápido possível.
Entendo que tenham outras oportunidades que mereçam ser destacadas, e procurei trazer os principais que tenho notado ao longo dos anos como de maior potencial. Também recomendo para quem quiser se aprofundar em mais oportunidades, o livro Execução do especialista em liderança, Ram Charan.