Uber, Airbnb, Facebook, Coursera e outras plataformas de negócios bem-sucedidas têm algo em comum: todas aplicam os fundamentos do modelo de negócios de plataforma.
Então, se você trabalha com plataformas de negócios ou está planejando desenvolver uma, este artigo é para você. Aqui eu vou explicar quais são esses princípios e como você pode usá-los no seu negócio.
Bora lá?
Para começar, o que é plataforma de negócios?
Se você é um produteiro experiente, pode pular esse tópico. Afinal de contas, já deve estar cansado de ouvir falar sobre a definição. Mas, para quem ainda está engatinhando na Gestão de Produtos ou pensando em abrir um negócio digital, entender o conceito é bem importante, antes de entrarmos, definitivamente, nos fundamentos.
A plataforma de negócios é um modelo que utiliza ferramentas tecnológicas para conectar duas partes, normalmente, produtores e consumidores. Entretanto, elas podem ultrapassar esses limites e abrigar outros interessados, formando um verdadeiro ecossistema. São tipo os “marketplaces 2.0”, uma vez que não só conectam pontas, mas também fazem a gestão do relacionamento entre uma parte e outra. Por exemplo, a OLX, que tem anúncios do prestador e disponibiliza contatos para ele ser encontrado pelo consumidor, é um marketplace. O Uber, por sua vez, é uma plataforma porque conecta prestador e consumidor automaticamente pelo seu app, faz curadoria de ambos os lados e ainda administra o pagamento.
Ou seja, é muito mais do que só conectar lados.
10 fundamentos da gestão de produtos para plataforma de negócios
Devidamente apresentados à plataforma de negócios, vamos logo ao que interessa: os fundamentos da gestão de produtos
1. Efeitos de rede
O primeiro fundamento são os de efeito de rede, e ele não está no topo da lista à toa. O efeito de rede é um dos mais importantes princípios das plataformas de negócios.
Para quem ainda não conhece, o efeito de rede está relacionado ao valor de um bem ou serviço devido à quantidade de usuários existentes. Por isso, algumas das principais metas de quem trabalha com plataforma de negócios é aumentar o número de usuários e ampliar a troca de valor.
Consequentemente, isso impacta no efeito de rede. Acontece que esse ciclo pode ser positivo ou negativo. Quando ele é positivo, evidentemente, a sua demanda tende a crescer e a base de usuários aumenta. Um lado da plataforma costuma elevar o número de usuários do outro lado. No entanto, se o fluxo é negativo, o número de usuários começa a despencar.
Por essa razão, o nosso papel como produteiros é olhar para todo o ecossistema e responder às seguintes perguntas:
- Qual lado do meu ecossistema tem mais poder para influenciar o outro? Esse lado é o seu líder.
- Quais são os gatilhos positivos para o crescimento do meu negócio?
- Qual é o apelo social do meu negócio para impulsionar o efeito de rede?
- Quais dores eu preciso resolver para não ter o efeito de rede negativo?
- Qual é o investimento que estou disposto a fazer para o lado líder
2. Arquitetura e Design
Nas plataformas de negócios, o design precisa ser emergente. Ou seja, deve crescer à medida que se desenvolve.
Quando falo do assunto, sempre brinco que vou fazer uma espécie de caça às bruxas com os PMs que utilizam o método BDUF (Big Design Up Front). Isso porque não há como prever todos os cenários e ter controle sobre eles.
Eu até recomendo, na verdade, seguir um dos princípios Lean, que consiste em esperar até o último momento para tomar uma decisão. Por mais que a gente queira se antecipar, essa nem sempre é a melhor solução para as plataformas de negócios.
3. Disrupção de pipeline
Uma das razões pelas quais as plataformas de negócios se destacam está relacionada à superação dos negócios de pipeline. Os negócios de pipeline são aqueles que englobam toda a cadeia de um produto ou serviço. Já as plataformas de negócios geram valor conectando interessados nos produtos ou serviços da ponta. Um exemplo clássico é o Airbnb, que não precisa construir hotéis para vender hospedagens.
Por isso, para que tenham sucesso, as plataformas precisam ser donas de recursos essenciais e devem criar valores que, dificilmente, serão copiados. E não necessariamente construindo tijolos para competir com as redes hoteleiras, entende?
4. O ovo ou a galinha
As plataformas de negócios, normalmente, unem dois lados, e você precisa descobrir qual deles é o líder. O líder é o seu público mais forte, que é capaz de atrair o outro.
É importante você ter em mente que o custo de aquisição do líder é mais alto, assim como o custo de reativação. Por isso, seus esforços precisam ser certeiros se você não quiser perder tempo e dinheiro.
O MVP, por exemplo, deve ser cativante logo de início. Assim, além de não frustrar os usuários, você ainda mantém as pessoas interessadas na próxima versão. Para o líder, invista em Product Management e aquisição por cluster. Para o outro lado, aposte em Product Marketing e estratégia de promoções.
É assim que plataformas como Uber e iFood trabalham. Os líderes são o motorista e o restaurante, respectivamente. Se um restaurante abandona o iFood, dezenas ou centenas de consumidores podem deixar a plataforma. E se esse restaurante estiver no concorrente, como o Uber Eats, por exemplo, os clientes tendem a migrar de plataforma. O restaurante tem o poder de promover o efeito de rede. Do outro lado, o Ifood atua para equilibrar a oferta e a demanda da plataforma.
E como ele faz isso?
Oferecendo promoções com descontos.
Dessa forma, o consumo fica sempre distribuído, satisfazendo os dois lados.
5. Unidade de valor
Unidade de valor é o sinal vital do seu produto. É como os sinais do seu batimento cardíaco. Embora você tenha vários outros fluxos e sinais para o seu corpo funcionar, se não houver batimentos cardíacos, não há vida. Ela representa o valor que a sua marca gera para o usuário. A partir dela é que o seu modelo de negócios deve ser estruturado.
De nada adianta definir a monetização, entre outros aspectos da plataforma, sem antes descobrir a sua unidade de valor. A do Facebook, por exemplo, é o like. Os usuários acessam a rede e se mantêm engajados nela para obter likes. E tudo gira em torno disso. Inclusive, o like ajuda o Facebook a otimizar as campanhas de ads com relação aos seus interesses.
Olha só como ele é importante para satisfazer o desejo mínimo de status de quem posta conteúdo, mas também é por ele que as recomendações passam. Então, reflita: Qual é a sua unidade de valor?
6. Abertura
Você pode adotar diversas estratégias de abertura (ou fechamento) de APIs para a sua plataforma de negócios.
No geral, elas se dividem em três modelos:
- Fechado: aceita apenas desenvolvedores homologados, utiliza linguagem/código pré-definidos e tem necessidade de licença da outra parte (B2B). Ex: Salesforce
- Semiaberto: admite desenvolvedores com cadastro, utiliza linguagem/código pré-definidos e, no caso da Apple, o aplicativo precisa ser aprovado pela empresa antes de ser disponibilizado. Ex. Apple Store
- Aberto: costuma vir associado à conta do Google e qualquer pessoa pode utilizar sem restrição. Ex. YouTube.
7. Governança
Se você é daqueles que enxergam a governança como algo tradicional e ultrapassado, é melhor rever esse conceito. A governança é extremamente importante para uma plataforma de negócios dar certo. Isso porque ela ajuda a criar riqueza de maneira justa e distribuída entre todas as partes e usuários.
Para tanto, você deve estruturar a governança como se fosse um estado. Defina as políticas de governança, como termos de uso, abertura (ou fechamento) de APIs, uso de dados e propriedade intelectual, etc.
Sabe a polêmica de excluir o perfil do Trump do Twitter? Bem, isso passa pela governança.
É uma reflexão profunda entre excluir alguém que não contribui para a qualidade da plataforma, mas também abre um precedente perigoso para outras exclusões no futuro. Imagina como pode fazer mal para uma plataforma como o Twitter começar a excluir pessoas em virtude do apelo popular. Isso, além de afetar a credibilidade da marca, também demonstra uma atuação autoritária da plataforma, fazendo com que ela não seja mais um lugar de geração de valor livre.
8. Métricas relevantes
As métricas variam de acordo com o momento da plataforma. Por isso, ao estabelecer quais serão usadas, identifique a fase do seu negócio: start up, scale up e maturity.
Na fase de startup, as métricas devem rastrear o crescimento das interações básicas, como volume, satisfação, liquidez, qualidade e matching. Elas devem avaliar tendências de crescimento usando % e não valores absolutos.
Já na fase de scale up, elas precisam medir o impacto no crescimento e a entrega de valor, como dimensão dos segmentos, equilíbrio da plataforma, LTV e conversão de vendas.
Por fim, na fase de maturity, é recomendado usar métricas que estimulem a inovação, além daquelas que servem para detectar ameaças dos concorrentes.
9. Estratégia
Toda plataforma de negócios precisa de um planejamento estratégico bem desenhado.
Nesse sentido, lembre-se sempre de considerar três dimensões fundamentais: a concorrência externa; a relação entre os usuários; e a relação entre usuários e governança.
Vou destacar aqui alguns pontos importantes que ajudarão você a construir suas estratégias:
- A competição tem menos importância do que a cocriação e a cooperação
- A inovação deve ser promovida entre os próprios participantes e usuários para depois capturar seu valor
- A concorrência se baseia nos seguintes pilares: escala de fornecimento, efeitos de rede, custo de migração da plataforma e valorização de parcerias acima das fusões e aquisições.
- Em alguns mercados, a concorrência é absurda e beira a falta de ética. Você sabia que algumas plataformas famosas já usaram crawler em concorrentes para aumentar sua base de informações ou prestadores de serviço?
10. Políticas e enfrentamento regulatório
Antes de tudo, quero dizer que a regulação não é o lado negro da força, viu? Embora as questões burocráticas atrapalhem muitas vezes, o regulatório é extremamente necessário para manter o mercado funcionando sem grandes riscos. É até interessante analisar o ciclo que as plataformas de negócios enfrentam nesse sentido.
As startups, normalmente, criticam a regulação, mas, quando atingem um patamar elevado, logo recorrem ao lobby para se proteger das ameaças.
Vale dizer ainda que os negócios inovadores que transformam a sociedade, geralmente, conquistam o poder de mudar a regulação.
Agora, já imaginou como seria o mercado financeiro se as instituições não tivessem certas obrigações regulatórias, como, por exemplo, garantir a disponibilidade de recursos financeiros para os seus clientes?
Pois, bem, antes de criticar veementemente a regulação, pense em como ela é importante em alguns mercados e também se o rebolde de hoje se tornará o guardião da regulação amanhã :)
Conclusão - Influência da Gestão de Produtos nas plataformas de negócios
Acredito que o papel da Gestão de Produtos nas plataformas de negócios não seja nenhuma novidade para você. Mas, neste artigo, vimos quais são os principais fundamentos e como eles interferem significativamente nos resultados.
Espero que o conteúdo tenha atendido às suas expectativas e, caso tenha ficado alguma dúvida, será um prazer ajudar a esclarecê-la.
É só entrar em contato comigo pelo LinkedIn.
Referências
- Livro: Plataforma: a revolução da estratégia, de Marshall W. Van Alstyne e Sangeet Poul Choudary
- Livro: Platform Scale: How an emerging business model helps startups build large empires with minimum investment, de Sangeet Paul Choudary
- Curso: CAC - Certified Agile Coach, com instrução de Peterson Laurentis sobre DEVOPs e Design Emergente.
- First Round Review: What I Learned From Developing Branding for Airbnb, Dropbox and Thumbtack.