Economia Circular: se você não conhece, está atrasado!

Como criar e produzir sem desperdício do início ao fim e ainda sustentar modelos negócios inteiros

Economia Circular: se você não conhece, está atrasado!

Ano passado, o que eu pensava da vida e fazia por ela, começou a mudar. Kate Raworth e seu “Economia Donut: uma alternativa ao crescimento a qualquer custo” passou por uma das minhas timelines e eu, curiosa e economista de formação, não resisti a uma passadinha na Amazon. Desde então, vários eventos foram me aproximando da Economia Circular. Vivências com alguns alunos do curso de Metadesign do Caio Vassão, blogs que levam a uma vida mais sustentável, conversas como algumas cabecinhas mais ativistas na empresa, e finalmente a Ellen MacArthur Foundation.

Pronto, já estava apaixonada. Lendo, vendo, ouvindo tudo que podia a respeito, participando de curso, seguindo pessoas, empresas e outras instituições que têm o planeta como propósito. Nós humanos sempre tivemos a ilusão de que somos soberanos no planeta, de que ele está ali para nos servir; #sqn.

Não é o caso de sermos nós e ele, mas nós somos ele; fazemos parte de um ecossistema, um sistema complexo no qual tudo está conectado, impacta e é impactado pelas ações de todos os seus integrantes. Você pode estar se perguntando o motivo deste assunto para o mundo dos PMs. E vou responder de forma simples: dependendo do tamanho de sua empresa, você pode compartilhar descobertas, definir prioridades, influenciar ou até ajudar a decidir os rumos do negócio. Então, acredito que posso plantar uma sementinha em você.

O que é Economia Circular?

Nosso modelo econômico atual não está mais funcionando para empresas, pessoas e o meio ambiente. A forma de existir e funcionar das empresas está profundamente enraizada em uma abordagem linear de crescimento - fazer, usar, descartar, a qual está fazendo com que recursos escassos existentes no planeta alcancem seus limites físicos. Ou seja, se pensamos em continuar fazendo Discovery e Delivery de produtos e serviços com base neste modelo Interestelar poderá ser uma boa pedida para uma “sessãozinha” básica de filme com pipoca. Só um resuminho sem spoiler: as reservas naturais da Terra estão chegando ao fim e um grupo de astronautas recebe a missão de verificar possíveis planetas para receberem a população mundial, possibilitando a continuação da espécie.

Tomando emprestada a definição utilizada pela Ellen MacArthur Foundation, a economia circular é uma alternativa ao modelo atual que busca redefinir a ideia que temos sobre progresso/crescimento. Como ela entende que tudo está interconectado, foca na busca de benefícios para todo o ecossistema, é apoiada na transição para fontes de energia renovável e se baseia em três princípios:

  • Eliminar resíduos e poluição desde o princípio
  • Manter produtos e materiais em uso
  • Regenerar sistemas naturais

O diagrama sistêmico abaixo elaborado pela fundação de Ellen demonstra como a economia circular busca reconstruir capital, seja ele financeiro, manufaturado, humano, social ou natural. Ele ilustra o fluxo contínuo de materiais técnicos e biológicos através do “círculo de valor”.

Deciões de Produto na Economia Circular

Quando se fala em Economia Circular, muita gente pensa que o Designer é a figura central. Ele é, assim como cada um dos demais perfis multidisciplinares necessários para desenhar ou redesenhar o ciclo completo de produtos com mindset regenerativo. A escala do que se precisa projetar não é limitada a produtos, mas alcança o tamanho das empresas, dos governos e dos sistemas econômicos. Então, quem gosta de palco deve esquecê-lo em prol de influenciar para que se juntem os perfis aderentes ao tamanho da missão.

Trazendo um pouquinho de exemplo prático, temos acesso a muitas matérias sobre a mudança no consumo das pessoas. Numa que li recentemente, algumas pessoas deixaram de pedir comida por aplicativo devido à quantidade de plástico gerada, inclusive, por itens que não haviam sido pedidos, tais como talheres de plástico ou sachês; isso sem falar das embalagens. A responsabilidade nestes casos, foi atribuída pelos consumidores à dona do aplicativo, tanto quanto aos próprios restaurantes.

Este foi só um exemplo do desafio que vem junto com a oportunidade gigantesca para os que já começaram ou começarão esta jornada mais circular. O Discovery de produtos/serviços precisa se transformar e passar a considerar o ciclo completo do que se está desenhando, o que inclui a forma como os resíduos voltarão à cadeia produtiva da indústria de origem, de outra que se beneficie deles, ou ao meio ambiente sem causar mal ao planeta.

Nada de novo, mas tudo que precisamos.

O conceito de economia circular não é nada novo, mas ganhou ainda mais força desde o fim da década de 1970. Algumas escolas de pensamento dão forma ao tema, sendo uma delas a filosofia trazida por Michael Braungart e Bill McDonough, no conceito Cradle to Cradle™. Este considera todos os materiais técnicos e biológicos envolvidos nos processos industriais e comerciais como nutrientes. O framework Cradle to Cradle, queridinho do mundo de produtos, é focado no design para a efetividade em termos de aumento dos impactos positivos e redução dos negativos na comercialização de produtos.

O que Economia Circular tem a ver com meu latifúndio?

A criatividade é uma das habilidades mais valorizadas nos profissionais e não é por acaso. Os PMs não vão salvar o planeta, claro. Mas que podem fazer parte da solução... ah, não só podem como devem. Dá para imaginar vários caminhos para isso acontecer, entre os quais: realizando uma gestão adequada dos stakeholders para negociar que participem da squad perfis diferentes dos usualmente encontrados nelas, tais como especialistas em logística, materiais, meio ambiente, etc., mesmo que em momentos específicos (isso garante o Discovery com um olhar para toda a jornada, não só do usuário, mas também do que acontece com o resíduo após o consumo), reaproveitando processos e/ou ferramentas já utilizados em outras squads, definindo e monitorando métricas relacionadas ao resultado para com o planeta, etc.

Uma publicação da LTS Consulting esclarece que a aplicação da economia circular em tecnologia segue a lógica “criar, entregar, preservar, gerenciar e reutilizar”, só que aplicada aos projetos, programas e aplicativos desenvolvidos. Ela ainda traz um dado levantado pelo IDC de que é possível reduzir em 28% o custo de criação de materiais digitais ao eliminar esforços duplicados, reduzir o número de materiais que são criados mas nunca usados e melhorar a reutilização desses arquivos. Isso tem a ver com o desenvolvimento de uma cultura de reaproveitamento que convida os profissionais de tecnologia a colaborarem entre si.

Ainda dá tempo

A hora de acordarmos é agora. Quanto mais demorarmos na nossa ilusão, mais difícil será nos resgatar. A transição para uma economia mais circular não é uma mudança fácil de se fazer, mas já temos alguns exemplos desta nova mentalidade que está surgindo no mundo dos negócios, e muitos deles são brasileiros, entre os quais a Usina São Francisco (agricultura regenerativa), a Retalhar (resíduos têxteis), Natura &Co (logística reversa). No Brasil, também já existem cursos disponíveis, de curta e de longa duração sobre o tema.

As instituições que saíram na frente construíram pra gente conhecimentos e ferramentas bem bacanas. Alguns exemplos são a Ellen MacArthur Foundation, que tem em seu site conceitos, cases, cursos, guias de design e muitos outros; e grande parte deste material é gratuito.

A IDEO, em conjunto com a Fundação, construiu o Circular Design Guide para ajudar inovadores a criarem soluções criativas para a economia circular.

Num primeiro momento pode até ser que a busca dos profissionais e das empresas seja o ganho de vantagem competitiva, mas ao se aprofundarem um pouquinho nos estudos sobre a economia circular, verão que a vantagem competitiva é fichinha comparada a algo bem mais relevante - nossa sobrevivência.

Referências: