Diferenciação e “Defensibilidade”: alguns caminhos para nadar em Oceano Azul

Você pode fazer tudo certo, mas sem uma vantagem única e sem conseguir superar as armadilhas ao longo do caminho, cavará o buraco onde não há petróleo.

Diferenciação e “Defensibilidade”: alguns caminhos para nadar em Oceano Azul
Photo by Adrien Converse / Unsplash

Você já deve ter sentido a mesma tensão que um empreendedor no Shark Tank quando um stakeholder ou investidor te faz a famigerada pergunta: “O que seu produto tem de diferente que não pode ser facilmente copiado?” Não precisa assistir muitos episódios para perceber que o que mais leva ao fracasso de aspirantes a aportes de investimento é a falta de um diferencial, daquilo que dificultará a cópia, baixa barreira de entrada.

Vamos pensar um pouco sobre o valor do “diferente”!

Aquilo que eu vejo e gosto, e é diferente do que eu sou ou tenho agrega valor para mim; e se eu sou ou tenho algo que pode ser potencializado com o que você me oferece de diferente, também é valor para mim. Mas, e se você me oferece algo que vejo como valor, mas que é facilmente copiável? Aí, você cai no oceano vermelho e terá que lutar numa das guerras mais áridas do mercado: a do preço.

Nada novo até aqui, mas uma coisa simples (#sqn) deve orientar o Discovery e continuar na cabeça do time no Delivery e Continuous Discovery: a vantagem única (ou injusta) do produto, o que o torna diferente e, por isso, é passível de ser percebido como valor pelo cliente dele. Parece tão óbvio, mas é impressionante como não só no programa semanal de TV, mas no mercado, vemos empreendedores com negócios maneiros, mas sem nada que permita dizer que terão sustentabilidade no longo prazo. Por que cometem um erro tão primário?

Basicamente porque a fórmula é fácil, mas arrisco afirmar que aplicá-la corretamente e chegar ao resultado ideal são alguns dos principais desafios no desenvolvimento de produtos ou negócios. Isso porque há armadilhas no meio do caminho. Citando alguns exemplos:

  • Colocar o usuário no centro x soluções prontas da cabeça: nos livros é fácil, mas é muito comum ver empresas com algumas cabecinhas inovadoras que adoram ter ideias brilhantes e lá se vai mais um produto construído a partir delas e não de um Discovery bem feito, validando a dor, o quanto ela é grande a ponto de fazer o cliente pagar, que cliente é esse, ... para só depois se pensar na solução e validá-la antes de construí-la. O resultado você já pode imaginar: um produto que você precisará criar demanda para ele; o pior dos mundos para um PM é achar o market-fit de um produto construído dessa forma.
  • Fazer Discovery adequado x pressa dos stakeholders: leva a alguns dos problemas mencionados acima, além de uma enorme pressão no time para fazer as coisas de forma atropelada e sem balanceamento de suas vidas pessoal e profissional, o que acaba levando à perda do potencial de criatividade, inovação e até a produtividade.
  • Falta de orçamento: compromete a qualidade ou prazo da entrega porque pode comprometer desde acesso a ferramentas adequadas de trabalho até a composição de um time sênior o suficiente para construir e encontrar o product-market fit do produto, e depois fazer growth dele.
  • Timing de mercado x mercado não pronto para o que se quer oferecer: às vezes o produto é extremamente inovador e a empresa insiste em seguir em frente, o que pode levar ao sucesso, mas também pode ser extremamente custoso em termos financeiros se o mercado não está preparado para recebê-lo. Isso acontece não só no B2C, mas muito no B2B.

Nem sempre é fácil conseguir fugir ou ter ações de mitigação de riscos para estas e outras armadilhas. Em algumas delas, o PM não tem o poder de decisão, mas pode e deve influenciar para aquilo que tiver dentro de sua zona de influência.

Tendo em mente essas armadilhas, agora volte sua atenção à necessidade do seu produto ou negócio ser diferenciado e sustentável no longo prazo. Aqui introduzo o conceito de “defensibilidade” que aprendi com Abhinav Sharma (Product Lead – Quora) na Masterclass “How to Build Digital Products” da Product School. Para ele, alcançá-la e se tornar indispensável no mercado diz respeito a ser capaz de endereçar o que as pessoas realmente precisam:

  • Recursos (água, comida, abrigo, entretenimento, etc.)
  • Outras pessoas (já que somos seres sociais, interdependentes)

E complementa que isso corresponde a:

  • Possuir recursos finitos (terra, propriedade intelectual, talento) e/ou
  • Operar uma rede da qual é difícil sair (rede, telecom, estradas, redes sociais, etc.)

Juntar estas 2 coisas é algo bem caro e, portanto, difícil de se alcançar (exemplo da AT&T no passado), o que leva a potenciais situações de monopólio. Mas, indo para o mundo do software, Abhinav aponta 3 coisas singulares a ele inerentes que você precisa se atentar:

  • Personalização (capacidade de ser diferente/único para cada pessoa)
  • Baixíssimo custo de cópia (sem custos marginais*, a barreira de entrada é baixa)
  • Rapidez nos efeitos de rede (aumentar o número de usuários torna o sistema mais valioso)

Levando estas 3 coisas em consideração, ele argumenta que para tornar um produto digital “defensible” ou indispensável e para fazer dinheiro/criar oportunidades de mercado, você tem 2 caminhos:

  • Bundling: agregar valor a um produto já forte ao adicionar novas funcionalidades que gerem valor aos usuários (funcionalidade Groups do Facebook, Messenger, etc.)
  • Unbundling: extrair uma funcionalidade e torná-la melhor ao ponto de separá-la (Craigslist que nos primórdios da internet funcionava como marketplace que vendia quase tudo, e com o tempo se desdobrou em várias empresas multibilionárias)

O “X’ da questão é conseguir identificar o momento certo de fazer isso e também estar atento às mudanças no contexto, cultura e tecnologia que disparam a necessidade de alteração no caminho escolhido. Algumas empresas como Loggi, Slack e Gympass fizeram o dever de casa direitinho quando se tornaram queridinhas do mercado brasileiro.

Resumindo bem...

A construção de um produto que os clientes realmente queiram (e paguem!) e que seja sustentável financeiramente no longo prazo passa por: realizar um bom Discovery e identificar a vantagem injusta do produto, fugir das armadilhas ao longo do caminho e buscar a tal da defensibilidade defendida por Abhinav Sharma. Claro que há outros pontos importantes ao longo da jornada, mas o que tratamos aqui já ajuda em muito os PMs a fugirem da guerra de preços do Oceano Vermelho.

* Custo marginal zero significa que o custo para se produzir e disponibilizar no mercado uma unidade a mais do seu produto ou serviço é bem baixo, o que deveria ser o caso dos produtos digitais. O custo marginal é importante porque ele é essencial para calcular o lucro e tomar decisões de negócio.

Referências