Desdobramento os níveis de estratégia para o tático
Entendendo o desdobramento estratégico em níveis, com visão para o tático e operacional.
Empresas não são feitas apenas para gerar lucro, mas para alcançar um objetivo de impacto duradouro, em um contexto maior do que elas mesmas.
As declarações de missão e visão são direcionadores que descrevem a empresa e sua essência. Descrevem os motivos e justificativas pelos quais a empresa faz o que faz, entregando seu serviço para o mercado.
Esses direcionadores ajudam na construção e manutenção da cultura da empresa, definindo os princípios e valores pelos quais a empresa prefere atuar com seus funcionários, clientes, parceiros e o mercado.
Tudo pode começar pela visão.
A Visão
Existe uma linha de raciocínio em que a visão é a forma pela qual a empresa busca alcançar a sua missão. É isso que o mercado faz até hoje e é isso que grande partes das empresas não revisitaram nos últimos anos.
A visão descreve um futuro aspiracional, sintetizando o valor percebido, buscando ser drasticamente diferente do padrão estabelecido, por meio de novas soluções.
Não quero ser redundante citando o exemplo da Patagonia, mas durante quatro décadas a missão deles era: "Build the best product, cause no unnecessary harm, use business to inspire and implement solutions to the environmental crisis." Numa tradução livre: "Construir o melhor produto, causar nenhum dano desnecessário, usar os negócios para inspirar e implementar soluções para a crise ambiental".
Contudo, para Yvon Chouinard[1], fundador da Patagonia, essa declaração de missão não era suficiente. Então, em Dezembro de 2018[2], ele informou aos funcionários que a declaração de missão da empresa mudaria para algo mais direto, urgente e cristalino. Traduzindo livremente: “A Patagônia está no negócio de salvar o nosso planeta natal”.
O objetivo dessa mudança foi justamente confirmar que o aspecto de cuidar do meio ambiente e a forma como lidamos com os recursos naturais são urgentes para a empresa. Essa visão não está focada apenas nas mudanças climáticas, mas na crise que enfrentamos com o clima e outros aspectos da natureza e do meio em que vivemos[3].
Já a visão da Patagonia, que existe para alcançar essa nova missão, é: Utilização de todos os seus recursos para proteger a vida na Terra.”
Logo, a visão da Patagonia está totalmente conectada à missão, confirmando sua forma de pensar sobre como lidar com a natureza e o planeta. Eles "usam todos os recursos para proteger a vida na Terra" porque "a Patagonia está no negócio de salvar o nosso planeta natal".
Outro exemplo é a Microsoft, que mudou sua missão durante a liderança de Ballmer e mudou novamente quando Satya Nadella iniciou sua presidência. As duas missões não são tão diferentes assim[4], mas a de Satya é certamente mais atual e com uma visão mais ampla de atuação.
Contudo, ambas as visões diferem da visão de Bill Gates, que era "Um computador em cada mesa e em cada casa".
Atualmente, a visão da Microsoft é:
Capacite cada pessoa e cada organização do planeta para alcançar mais. -- Declaração de visão da Microsoft[5]
A partir desses contextos de missão e visão, e entendendo que há milhares de dúvidas e confusões sobre os significados desses conceitos, comecei a formar um pensamento bastante inspirado por Simon Sinek, em que precisamos explicitar a causa que estamos defendendo com o nosso negócio.
A causa viria antes da missão e da visão. Isso me faz pensar de forma contrária ao que o mercado geralmente diz, colocando a missão e a visão como elementos que devem ser perseguidos, como se não fossem alcançáveis, como se fossem simples guias inspiracionais.
A missão e a visão precisam estar ancoradas em algo maior. E elas precisam ser alcançadas em algum momento, mesmo que demore muito para que isso aconteça.
Simon Sinek explica que as empresas devem se balizar em um tipo de propósito maior, que motive as pessoas a se engajarem e a se dedicarem a algo que vai além do interesse pessoal. Ele chama isso de Causa Justa, e embora se assemelhe muito à missão, ela é ainda mais ampla.
Geralmente, quando você chega a uma empresa, a base estrutural já está montada. Exceto se você abrir sua própria empresa, é muito improvável que você mude pilares fundamentais que criam a identidade, valores e princípios de comportamento que norteiam a cultura da empresa.
É necessário existir uma conexão clara das atividades que executamos todos os dias com os objetivos estratégicos da empresa. Esses objetivos precisam estar inteiramente conectados e direcionados para possibilitar o alcance da visão, definida lá atrás pelos fundadores.
A missão da empresa deveria ser alcançada em algum momento da trajetória de vida do negócio. Podemos dizer que a empresa falhou quando não cumpre com a sua missão ou que trabalha numa mesma missão durante a vida inteira. Mas a missão é um objetivo de longuíssimo prazo. Para mim, algo em torno de 10 anos possa ser um bom parâmetro para "longuíssimo prazo". A Causa Justa fica acima dessa missão. Ela não é alcançada e nem esgotada pelo tempo.
A Causa Justa pode ser definida em 5 características:
- Ela defende: isso quer dizer que a Causa Justa expressa muito mais o que você e a empresa defende do que vocês enfrentam (concorrentes, desafios do negócio etc) ou atacam (segmentos, problemas etc).
- É inclusiva: a Causa Justa atrai pessoas com pensamentos diferentes, mas que queiram contribuir para uma mesma causa. Ela inspira todas as pessoas de qualquer especialidade da empresa, de forma que essas pessoas se sintam valorizadas.
- É orientada a serviço: com o intuito de beneficiar não apenas a empresa, mas também os consumidores. Isso quer dizer que não faz sentido fazer algo que só tenha valor para empresa e que isso não se reflita em algo positivo para os clientes.
- É resiliente: não deve ser baseada em algo frágil como uma regra, uma tecnologia ou uma cultura. Essas coisas podem sumir, mudar e se transformar com o tempo. A Causa Justa deve resistir às mudanças.
- É idealista: a Causa Justa é um ideal que não pode ser resumido apenas para alcançar um determinado objetivo. Ela precisa ser algo nobre, que talvez possamos devotar nossos ideais pessoais e profissionais para persegui-la.
Você não defende a empresa, mas a causa que a empresa escolheu defender. A empresa é menor que a causa. Se uma empresa deixa de defender uma causa que você acredita, você pode procurar outra mais alinhada com as suas expectativas.
A conexão entre Causa Justa e Visão
Veja bem: Causa Justa, Missão e Propósito, já estão decididas desde os primórdios da empresa. Muito dificilmente as pessoas que chegam depois conseguem mudar esses pontos. Elas precedem a estratégia. A estratégia deve seguir as delimitações definidas pela Causa Justa, Missão e Propósito. Caso contrário, o discurso será muito incoerente do ponto de vista de cultura empresarial e também de imagem e marca externa da empresa.
Para falar a verdade, não terá tanta importância assim o nome que a sua empresa usou para definir as coisas... se é missão, visão, causa justa... tanto faz, contanto que ela defina declarações que sejam direcionadores claros. Aqui no livro estou usando a abordagem de missão e visão como sendo declarações de longo ou longuíssimo prazo e a Causa Justa como sendo algo infinito.
A Causa Justa, a visão e a missão são aspectos sobre como a empresa pode ser melhor do que ela mesma AGORA, ou seja, melhor do que ela já foi, para potencializar a forma com que cria e executa seus negócios, sobre como ela lida com as pessoas e constrói modelos éticos, lucrativos e longevos.

A Causa Justa, juntamente com a Visão (missão ou propósito), definem a aspiração vencedora da empresa. Elas tentam detalhar os motivos pelo qual a empresa quer estar naquele mercado, tentando solucionar aqueles problemas específicos.
Essas definições também ajudam a definir quais seriam os grandes objetivos e posicionamentos da empresa. Deveria ficar mais claro aqui, inclusive, quais seriam os direcionadores de cultura da empresa, ajudando os líderes a criarem uma unidade de comportamento entre as pessoas que fazem parte do grupo.

Veja que você pode adotar mais do que um direcionador se achar que isso pode ajudar as pessoas a entenderem melhor as motivações do negócio. Mas não acho que seja necessário. Minha sugestão seria deixar claro o que é a Causa Justa da empresa e depois escolher adotar uma visão, missão ou propósito.
Lembre-se que no final, todos eles são direcionadores para justificar nossas ações.
Iniciando as quebras das camadas estratégicas: os níveis da estratégia na visão militar
Dado que entendemos que causa justa, missão e visão vêm antes da estratégia e eles direcionam todas as camadas posteriores, facilitando as escolhas que a empresa faz para progredir o seu negócio, quero começar a detalhar os níveis que fazem parte da estratégia e como conectamos isso com a visão tática e operacional.
Definimos a estratégia durante todo o início do livro como um posicionamento único e sustentável da empresa perante o mercado e seus concorrentes, por meio da sinergia das suas atividades. Mas a estratégia é formada por várias camadas além da própria estratégia. Fica fácil entender isso a partir da visão militar.
O conceito de estratégia no âmbito militar é formado por vários níveis. Os nomes desses níveis irão diferir um pouco dos nomes usados na estratégia corporativa, mas a analogia é totalmente equivalente.
Os quatro níveis na estratégia militar de guerra são:
- Política: O nível mais alto, onde são arranjados acordos e relações nacionais e internacionais, onde se determina os motivos e as decisões de ir ou não para uma guerra. Carl Von Clausewitz, um general do Reino da Prússia, grande teórico sobre guerra, diz que a guerra é uma continuação da política por outros meios;
- Estratégia: Dado que a decisão de ir para guerra foi afirmativa, nesse nível é onde acontece a condução e os direcionamentos mais macros da guerra. É aqui que se define objetivos que irão direcionar a vitória. Em outras palavras, é esse nível que define o "como ganharemos essa guerra";
- Operação: Neste nível é onde definimos o como, quando, onde e qual o propósito as forças militares atuarão em combate para arrasar o adversário. As operações definem basicamente quais missões e objetivos serão alcançados no campo de guerra. Aqui a analogia com o mundo corporativo pode causar confusão. No jargão militar, a operação é o que link do tático com a estratégia. No mundo corporativo, isso é basicamente o que chamamos de tático ou execução;
- Tática: Esse é o nível da execução da guerra em si. É basicamente a realização do que foi planejado no nível de operação. É a batalha, onde os soldados se enfrentam. Geralmente essa fase começa 48 horas antes da realização do fato em si;

É interessante notar que o nível operacional só foi oficialmente introduzido na disciplina de guerra na década de 1980[6].
Sozinho, o nível tático não alcança os objetivos estratégicos e nem ganha a guerra. Os resultados das ações táticas são úteis apenas quando conectadas com o contexto desenhado pelo nível de estratégia e orquestrado pelo nível operacional.
Os níveis de estratégia na visão corporativa
Para ficar mais coerente para a nossa realidade, é necessário fazer uma mudança entre as analogias militar e corporativa, invertendo os níveis de Operacional e Tático, mantendo os significados e as responsabilidades dessas camadas.
O nível da política não existe no conceito corporativo. Na verdade, ela é necessária quando as empresas tem um impacto ou são impactadas por regulações, regras e leis conectadas com o governo e a sociedade.
Mas eu enxergo que ela faz parte da camada de estratégia. Logo, um desenho mais correto para a realidade corporativa que vivemos seria:

O livro Exploring Strategy[7] quebra o desdobramento estratégico em três partes, sendo eles:
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